- Por que você não tem um gato ou um cachorro pra te fazer companhia? É tudo tão estranho por aqui. Você tem essa porrada de discos e livros velhos, a maioria cobertos de pó, e pelo jeito você não recebe uma visita há bastante tempo. Talvez um animal te fizesse bem.
- Obrigado, mas estou bem assim. Gosto dos livros, dos discos e até do pó.
- Você não gosta de animais?
- Pelo contrário. Eu gosto muito deles, e é exatamente por isso que não os mantenho por aqui.
- Você é um cara estranho.
Ela andou até a escrivaninha e colocou as mãos em cadernos de anotações.
- Não acho que você deveria mexer nisso. - Falei calmamente.
- Por quê? Há algo aqui que você não gostaria que fosse lido?
- Não. Há algo aí que você não irá gostar de ler.
- Você é um cara realmente estranho.
- Você não é a primeira a me dizer isso.
- Aposto que foi uma dessas garotas que te deixou e que você escreve sobre que também te falou isso, não estou certa?
- Você faz muitas perguntas, e eu não sou bom em respondê-las.
- Você já foi jornalista e já fez entrevistas, então você sabe porque as perguntas tem de ser feitas.
- Eu nunca disse que gostava de fazer isso, e nem que sabia a razão de fazê-lo.
- Mas você as fazia.
- Mas nunca esperava uma resposta.
- Eu também não espero. Elas estão estampadas no seu rosto, nas suas palavras e por esse apartamento também.
Me ajeitei na cadeira e servi um gole de cerveja. Acendi um cigarro com a mão e dei duas baforadas bem devagar.
- Não há respostas suficientes. - Falei.
- Você não faz perguntas suficientes. - Ela respondeu.
- E pretendo continuar assim. - Completei.
- Você realmente deveria ter um animal por aqui. Talvez vocês se entendessem.
- Talvez não.
Terminei a cerveja e fui até a cozinha buscar outra. Parei em frente à vitrola e troquei o disco. Let It Bleed dos Stones por Rubber Soul dos Beatles. Aquela era uma noite estranha, e acho que ela estava certa. Eu realmente era um cara estranho.
Um comentário:
porra bom pra caralho!
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