quarta-feira, março 28, 2012

Cometo erros, como todo mundo. O problema é que meus erros são um pouco maiores, e minhas culpas também.

sábado, março 24, 2012

- "Cadê a sua galera?", ela me perguntou.

- "Eu sou a minha galera", respondi.

quarta-feira, março 21, 2012

Costumava imaginar que tinha morrido. Relia tudo o que tinha escrito, e as palavras apareciam mais claras, mais belas e mais sinceras. Quando se morre, tudo se torna mais poético. Costumava achar que seria um grande poeta se morresse. Seria Arthur Rimbaud até seus 21 anos. Seria Jack Kerouac destilando prosas poéticas para os solitários. Seria um poeta apaixonado e honesto, mas, além de tudo isso, seria morto, inatingível. Pra que ser poeta ainda vivo? Pra que prestar contas aos outros? Pra que se explicar em entrevistas e matar seu próprio mito? Ah, passar bem, meu caro. Nada disso tinha muita raça. Nada disso tinha nenhuma graça. A verdade da literatura estava na paixão, na dor, na morte. A verdade da literatura estava enterrada e descansava em paz. Pra se fazer poesia não se pode estar vivo. Pelo menos não de espírito. Quando se poetiza, é porque algo ali já morreu. É porque é hora de enterrar os velhos fantasmas que insistem em nos assombrar. A grande magia estava no passado, no que foi vivido, sofrido, escrito e enterrado. O que acontece agora? Pouco me importa o que acontece agora! Bando de cretinos, empurrando suas angústias atuais e me empurrando suas preocupações pela goela! Eu não quero nada disso! Eu quero ver o canto dos calados, o choro dos falecidos, a desgraçada dos passados. Nada é mais bonito do que uma tristeza não resolvida. Nada é mais brilhante do que uma alma adormecida. É porque quando calam o corpo, a alma fica mais bonita.

Um viva a todos os poetas já mortos e enterrados. Que seus segredos permaneçam intactos. Que suas almas permaneçam abençoadas.

segunda-feira, março 19, 2012

Ah, e nós, nós que não vivemos os anos 60, que daríamos tudo para estar lá, que nos debatemos questionando a injustiça do destino. "Eu só queria ter nascido no mesmo ano que meu avô", eu bradava em madrugadas modorrentas, destilando meu whisky e minhas cervejinhas com discos dos de Dylan, dos Stones, dos Beatles e dos Zombies. "Quanta injustiça, ó mundo!", completava, em mais um acesso de indignação.

"Mas, peraí", eu pensava então com minhas próprias indagações. "Será que se eu tivesse por lá, eu teria tido a chance de gostar de tudo isso, e conhecer cada um desses discos?". Talvez não, concluí. Era mesmo fantástico poder desfrutar dos discos agora, cinquenta anos depois. "Mas ah, se eu estivesse, que bom seria...", completava, em deleites imaginários onde me esbaldava em woodstock, me divertia em Greenwich Village, me acabava em Londres.

"Ah, mas esse dia ainda há de chegar. Seja nessa ou na próxima encarnação: anos 60, eu estarei lá!", me consolava em um último pensamento saudosista atemporal. "Tê cuida, meu querido Dylan, meu genial Lennon, meu incrível Burdon. A gente ainda se vê, pode ter certeza disso!".

E eu acho que no fundo eu tinha mesmo certeza que a gente fosse se ver. Mesmo se fosse assim, ouvindo seus maravilhosos discos em madrugadas modorrentas e solitárias, contemplando a maravilha de cada canção, a poesia de cada riff e a beleza de cada harmonia.

Eu precisava dos anos 60. Todo santo dia.

quarta-feira, março 14, 2012

você foi terrível
e eu fui desprezível
quando te ignorei
quando te amaldiçoei
com todas minhas forças.

você foi uma vadia
e eu um idiota
quando tive histeria
por ter levado uma bota.

você foi horrível
e assim sempre será
pelo menos aqui dentro
isso nunca vai mudar.

agora some daqui
e não volta nunca mais
esse velho garoto
não merece sofrer mais.
silêncio
escuro
meu coração
em cima do muro.
é tarde,
muito tarde,
madrugada.

agora,
não me restou,
mais nada.
cruzo as ruas com rapidez
desejando que ninguém me veja
que ninguém me siga
que ninguém me esqueça.

cruzo as ruas com avidez
tentando alcançar o conforto
de meu pequeno apartamento.

cruzo as ruas com perigo
sabendo que no fundo
estou muito sozinho.

cruzo as ruas como um tolo
pensando em todos os problemas
e nas dores sem consolo.

cruzo as ruas como um cão
rezando pra não ser atropelado
sonhando que na próxima esquina
haja um bife mal-passado.

cruzo as ruas como um poeta
já cansado de escrever
como um pateta
já cansado de perder.

cruzo as ruas como cruzava
quando pensava em você.

essa parte ainda é igual
mas não posso mais te ver.

cruzo as ruas já sem medo
por não ter o que perder.
cada vez mais estou certo
de que é incerto
que minha alma
seja salva.

cada vez mais estou certo
de que acabarei
da mesma forma como comecei
e não, isso não é nada
bom.

cada vez mais estou certo
que encontrarei minha rendição
através da música.
que encontrarei minha salvação
através da poesia
solitária.

cada vez mais estou certo
de que continuarei sonhando
com tempos melhores
que nunca virão.

cada vez mais estou certo
de que esses pesadelos com você
nunca não desaperecer.

e cada vez mais estou certo
de que viverei essa vida
para sempre.

cada vez mais estou certo
de que estou condenado
a ser esse eterno
descrente.

cada vez mais estou certo
e prometo não esquecer
que estou destinado
a sozinho morrer.
seu fantasma sempre aparece
de madrugada
me lembrando do que você fez
e me mostrando que a culpa
foi somente minha.

seu fantasma sempre aparece
para me mostrar que fui fraco,
que não fui homem o suficiente
para te amar.

seu fantasma sempre aparece
para me mostrar que talvez
meu melhor amigo seja mesmo
muito melhor do que eu jamais fui

seu fantasma sempre aparece
rindo da minha cara, me humilhando
noite, após, noite
me dizendo que eu nunca
vou chegar lá.

seu fantasma sempre aparece
pra me manter conformado,
quieto e detonado.

seu fantasma sempre aparece
pra me mostrar de uma vez por todas
que não mereço
seu amor.

seu fantasma sempre me aparece
me contando as histórias mais sórdidas
me causando discórdia
me alastrando de dor.

seu fantasma sempre aparece
pra me mostrar
quem eu realmente sou.

terça-feira, março 13, 2012

caí a noite
entra a madrugada
as angústias voltam
os discos tristes
também.

sexta-feira, março 09, 2012

Uma temporada no inferno

Antes, se lembro bem, minha vida era um festim em que se abriam todos os corações, todos os vinhos corriam.
Uma noite, fiz a Beleza sentar no meu colo. E achei amarga. Injuriei.

Me preveni contra a injustiça.

Fugi. Ó bruxas, ó miséria, ó ódio, a vós meu tesouro foi entregue!

Consegui fazer desaparecer no meu espírito toda a esperança humana. Para extirpar qualquer alegria dava o salto mudo do animal feroz.

Chamei o pelotão para, morrendo, morder a coronha dos fuzis. Chamei os torturadores para me afogarem com areia, sangue. A desgraça foi meu Deus. Me estendi na lama.Fui me secar no ar do crime. Preguei peças à loucura.

E a primavera me trouxe o riso horrível do idiota.

Ora, ultimamente, chegando ao ponto de soltar o último basta!, pensei em buscar a chave do antigo festim, que talvez me devolvesse o apetite dele.

A caridade é a chave.-Inspiração que prova que eu estava sonhando!

"Continuarás hiena, etc..." repete o demônio que me orna de amáveis flores de ópio. "A morte virá com todos os teus desejos, e o teu egoísmo e todos os pecados capitais."

Ah! pequei demais:- Mas, caro Satã, por favor, um cenho menos carregado! e esperando algumas pequenas covardias em atraso, como aprecia no escritor a falta de faculdades descritivas e instrutivas, lhe destaco estas assustadoras páginas do meu bloco de condenado eterno.

Arthur Rimbaud