Era uma quarta-feira como outra qualquer. Na outra noite eu tinha ficado na casa de um amigo bebendo umas garrafas de vinho e fumando haxixe. Não gosto muito dessas coisas de fumar, com exceção do cigarro, mas cada dia é um dia. A merda já estava feita. Acordei por volta do meio-dia, como sempre. Fui até o banheiro para fazer todas essas coisas que as pessoas fazem quando acordam. Um barulho de gente falando e de multidão vinha de fora. Estranhei aquilo tudo. Que porra estaria acontecendo hoje. Isso era normal na Avenida Paulista. Todo dia algum protesto, manifestação, celebridade ou coisa assim atraia um monte de idiotas e curiosos a ficarem parados pelas ruas. Fui até a janela da sala pra fumar meu cigarro matinal e ver o que estava acontecendo.
Na frente do prédio havia uma multidão de curiosos. Enxuguei os olhos e tentei me recuperar do sono recém acordado. Olhei pra baixo e vi algumas motos e carros de policia. Alguns policiais estavam no prédio. Um pouco abaixo da minha janela, mais ao lado direito havia uma pequena área isolada com fita e o chão coberto com uma lona. Alguém havia se matado. Podia ter sido eu, pensei enquanto acendia o cigarro.
Encontrei um dos caras que dividem o apartamento comigo. Ele disse que um dos funcionários que estava reformando a fachada do prédio havia caído em cheio. Uma pena, eu pensei. Antes fosse suicídio. Imaginei que aquela porra toda ia ser uma dor de cabeça pro condomínio. Mas que se foda, eu era só um locatário do locatário. Não tinha nada a ver com aquilo.
Sai pra almoçar e fui pela porta dos fundos. Além de sair mais perto da rua do restaurante que costumava freqüentar não precisava cruzar com aquela multidão de gente e coisas assim. Depois que voltei ainda continuavam por lá. Durante a tarde carros do IML, de emissoras de televisão e reportagens chegavam até a frente do prédio. Os curiosos continuavam por ali, como bons desocupados que eram. Eu também era um desocupado, mas não era tão enxerido.
Continuei em casa sem fazer nada. Era a porra de uma quarta-feira. Eu continuava sem nada pra fazer. Acho que tinha um ou outro trabalho da faculdade, mas não me importava muito com aquilo. De noite fui pra faculdade. O tumulto já havia acabado. Pelo menos isso. Assisti a porcaria da aula e agüentei as mesmas chatices de sempre. De noite voltei pra casa e a curiosidade despertou em mim. Resolvi ir conversar com o porteiro. Estavam dois lá, conversando e fumando cigarros. Acendi um dos meus cigarros e fiquei lá com eles.
Perguntei o que havia acontecido. O cara era chefe de cozinha de um dos melhores hotéis da cidade, a duas quadras daqui. Tinha grana pra caralho e morava sozinho, a família estava na França. Apesar de já ter uns 65 anos ainda era bem conservado. Era o que eles diziam. Se jogou do 20º andar. Uma merda toda. Ninguém sabia bem o porque. Como é que um cara com uma vida daquelas fazia aquilo? Eles se perguntavam e se questionavam em lamentos. Eu acho que sabia responder. Ninguém sabe o que se passa na cabeça de cada um, mas pra mim não era difícil imaginar. Pelo menos não tinha sido a minha vez.
Nenhum comentário:
Postar um comentário