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As coisas parecem um pouco estranhas quando você tem quase dezenove anos e ainda não está muito certo do que quer fazer da vida. Acho que todo mundo, ou quase todo mundo, já passou por algo parecido na vida. É um bocado estranho, e você tem que decidir o que fazer logo e começar a fazer porque é o dinheiro dos seus pais que está em jogo. Eles apostam que você vai ser um grande profissional e podem ver seu grande futuro, mas pra isso contam com que você entre numa boa faculdade, leve as coisas a sério, arranje um bom estágio, tire boas notas e assim por diante.
É mais ou menos assim que as coisas acontecem pra algumas pessoas do meu tipo. Uma prova de exame da faculdade no dia seguinte, e cá estou eu, bebericando uma dose de uísque e assistindo meio sem atenção e sem muito interesse o jornal noturno que mostra o jornalista iraquiano tacando um sapato no presidente norte-americano George W. Bush e infelizmente não atingindo seu alvo com sucesso.
Por falar em jornalismo, é essa a faculdade que eu estou cursando, ou tentando cursar. Ainda não sei direito se é o que quero da vida. Como eu disse, não da pra ter muitas certezas quando você não sabe nem mesmo o que pode fazer com alguma eficiência. Mas por que reclamar? Fui eu que escolhi seguir esse curso e prestar o vestibular numa renomada faculdade paulistana, e com felicidade passar. E foi por pura e espontânea vontade (e que grande vontade!) que eu decidi me mudar da minha cidade no interior do Paraná para a capital paulista e a maior cidade da América Latina para estudar jornalismo. Agora, passados quase dez meses aqui estou eu, me indagando sobre o que fazer da minha vidinha.
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Paralelismo, polifonia, ambigüidade, e redação para o exame de língua portuguesa. Agenda-setting, Marx, Weber e Durkheim para o exame de sociologia. Pierre Levy e Marshall McLuhan para o exame de teoria da comunicação. Três exames logo no primeiro ano para alguém que não faz nada além de estudar. Eu supostamente deveria estar estudando igual um louco, mas é claro que não. É claro que continuo aqui, ouvindo ao Bob Dylan e fumando alguns cigarros. O que eu devo fazer, meu Deus? Eu não, eu definitivamente não sei. Mas olha só, ainda tenho o dia inteiro de amanhã pra estudar, e não posso negar que o que estudei hoje já deve me ajudar um pouco nessa bendita prova. Eu só indago se esse esforço todo vai valer a pena. E essa é uma indagação sem fim, que só pode ser descoberta seguindo adiante, e não sei se estou disposto a fazer isso.
O ano é 2008. O mundo está em uma crise econômica profunda e o natal está chegando. A Avenida Paulista brilha com luzes, arvores de natal e carros passando todas as horas do dia e da noite. Da janela do apartamento eu só posso enxergar que, além de um futuro incerto, tenho também um montão de outras dúvidas. A paixão de Cristo, os presentes do papai Noel, o clima de solidariedade típico da época, e o mundo girando e girando onde tudo acontece quase sempre igual.
Que deselegante da minha parte, nem mesmo me apresentar. Acho que seria conveniente dizer quem sou neste momento, em que partilho aqui algumas de minhas pequenas dúvidas e anseios que pairam sobre essa cabecinha de um jovem de quase dezenove anos. Me chamo Rick Nicoletti e tenho dezoito anos e onze meses. Não posso dizer que nesse tempo de vida vi de tudo, porque na verdade não vi quase mesmo é de nada. Bom, talvez eu tenha visto um pouco de tudo e um monte de nada. Depende do ponto de vista. E esse tal é o que me confunde cada vez mais.
Posso dizer que sou um tanto quanto pessimista. Não do tipo que acha que o mundo vai explodir e que todo mundo vai morrer amanhã, mas sim do tipo desesperança. “Que infame!”, você deve estar pensando. Um jovem de dezenove anos ainda não-completados achando que sabe alguma coisa da vida. Pois é, meu caro. Também daria de tudo pra saber de onde veio toda essa desesperança. Mas não se engane, ás vezes aquilo que falamos não é aquilo que pensamos, e ás vezes aquilo que fazemos não condiz com aquilo que falamos nem tampouco com o que pensamos, e é por isso e por mais milhares de outros motivos e talvez nenhum deles que eu escrevo coisas como essa. Nas palavras estão o mistério, a vida e a cabeça de cada um em letras e papel. É nas bibliotecas que me encontro em meio a esperança que perdi neste meu pouco tempo de vida. É com Ernest Heminghway, Jack Kerouac, John Fante, Charles Bukowsi, Dostoiévski e muitos outros que consigo enxergar só um pouco do que são as coisas. Cada um a seu modo, cada um de seu jeito, cada um em sua época. Estes e outros senhores me apresentam seu mundo, sua época, sua vida e todas as suas histórias de maneira particular e geral que só verdadeiros gênios podem faze-lo. É nas bibliotecas que a vida permanece semeada e que as histórias continuam sendo contadas. Cobertos de poeira e espreitados em prateleiras esquecidas que cada um daqueles grandes nomes permanece vivo para quem os quiser conhecer. E é isso que eu busco em minha vida. Mas é isso que me questiono. Como dar ao mundo o que ele quer de nós, e como tirar do mundo o que queremos dele?
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Pernas pra que te quero. Pra ficarem sentadas aí descansando embaixo da mesa enquanto meus braços trabalham arduamente aqui em cima e se revezam entre goles no uísque, tragadas no cigarro e frenéticas e ritmadas digitações no teclado do computador. Hoje, enquanto passava pela Brigadeiro Luís Antonio, seguindo em direção ao supermercado e passando em frente ao sujo e barato boteco que costumo freqüentar para tomar algumas cervejas e vez ou outra acompanhar jogos de futebol, senti que vocês fraquejavam querendo entrar, escolher a mesma mesa de sempre e só sair depois de algumas cervejas. Mas eu não podia fazer aquilo, é claro que não podia. Eu tinha que comprar coisas para casa, pois agora moro sozinho, e a responsabilidade vem em primeiro lugar. Então seguimos, mas dentro do supermercado foi a minha vez de retribuir e, com o dinheiro que não tinha que resolvi comprar uma bela garrafa de uísque e dois maços de cigarro para passar junto com os pães, frios, filé de frango, leite, macarrão instantâneo e etc. Só por causa de vocês, e por causa de mim, e por causa das palavras, e das músicas, e de Bob Dylan e de todas as coisas do mundo e talvez de nenhuma delas, o que talvez seja a grande verdade.
Que tipo de maluco eu sou? Alguém que conversa com as próprias pernas e pensa que elas tem vida própria definitivamente não é normal. Esta explicito em meus atos. Aonde eu vou parar com todas essas coisas? Só Deus sabe. Mas antes disso preciso saber. Ele sabe quem sou eu? Ele realmente existe? Todas aquelas coisas que diziam na igreja quando eu era apenas uma criança são verdades? Todas aquelas coisas escritas na bíblia realmente aconteceram e vão realmente acontecer? No que eu devo acreditar? Pra onde devo ir? O que devo fazer?
São tantas e tantas dúvidas, e tantas e tantas coisas que eu gostaria de saber. Mas eu não tenho essas respostas, e pra falar a verdade nunca achei ninguém que realmente tivesse as respostas para as milhares de coisas que eu desejo saber. E é por isso que eu continuo procurando. E vivendo. E escrevendo. E fazendo esse bocado de coisas sem sentido.
Continua...
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