sexta-feira, agosto 24, 2012

Capítulo 1


Eu costumava ter disposição pra escrever. Olha só, eu tinha dezoito anos de idade e tinha acabado de chegar em uma cidade gigantesca. Aquilo tudo era novo pra mim, e eu ficava meio assustado e encantando, chutando tampinhas na rua feito um personagem do João Antônio e andando pelas ruas como o bom e velho Arturo Bandini, acreditando que atrás desses muros cinzas e dessa cidade cheia de gente havia algo guardado pra mim, algo em que eu podia acreditar. Infelizmente eu estava errado. Ainda não sou velho, mas sinto que uma parte dessa esperança já foi embora. Era uma sensação totalmente diferente. Eu olhava para o espelho, encarava aquele rosto jovem e acreditava que podia ser um escritor. Eu sentava em frente ao notebook e digitava com fervor, escrevia textos gigantes, recheados de uma poesia boba e pouco inspirada, acreditando que eu estava fazendo algo verdadeiro, que aquilo ia me levar a algum lugar. Depois, eu relia tudo e pensava em como era horrível. Mas parte de mim acreditava nesse tipo de coisa. Pode até parecer bobagem, mas, olha só, eu só tinha dezoito anos de idade. Você não pensa direito com essa idade. Teoricamente, você já é um adulto, mas na verdade você só quer focar suas esperanças. Esse é o lado triste de envelhecer. Aos poucos, suas opções vão se restringindo a apenas quatro ou cinco. E depois, a duas ou três. Até que enfim chegam a uma única opção. Se você fez a escolha errada em algum momento, você se lascou. Não vai mais adiantar rezar, e seus pais não vão estar aqui pra te ajudar. Vai ser sorte se você tiver uns amigos. Mas acredito que é melhor não pensar nisso. 

O pessoal frequentemente me aponta como um pessimista, e não posso dizer que eles estão errados. Ultimamente, entrei numas de acreditar que eu era uma espécie de fantasma. Do tipo que existe, mas só alguns conseguem enxergar. E quem vê normalmente se assusta. Muito fantasioso? É, acredito que sim. Ainda lembro das professoras do primário dizendo que eu era criativo até demais. Eu inventava personagens, países, histórias e situações inimagináveis. Acredito que toda criança faz isso, mas no meu caso isso acabou se tornando um problema. De certa forma, acho que nunca consegui encarar o mundo da maneira correta – se é que ela existe, é claro. O que eu quero dizer é que eu nunca consegui me adaptar a este tipo de coisa. Costumava achar que se tivesse nascido em outra época, as coisas teriam sido melhores, mas hoje em dia até mesmo essa utopia foi por água abaixo. Quer dizer, é claro que eu ia querer viver em outra época, ouvir boa música e ver as garotas usando aqueles vestidos e penteados lindos, e sem toda essa chateação de proibir isso ou aquilo outro, mas no fundo eu sei que não seria tão diferente assim. Eu ia continuar me olhando no espelho e perguntando onde está aquela esperança que eu tinha aos dezoito anos de idade. “Você é um merda, Rick Nicoletti”, dizem as vozes pra mim. Peraí, eu não quis dizer “as vozes” como nesse papo de filme de terror ou de maluco atirador de cinema, é só mesmo uma expressão. Eu nunca ouvi vozes, mas se algum dia eu ouvir eu tenho quase certeza que elas vão me mandar parar de choramingar e criar alguma vergonha na cara. “Desiste desse sonho besta, seu bostinha”, é o que eu acho que eu ia ter que ouvir. Então é melhor ficar assim, não é? 

Olha só, se tu chegou até aqui e aguento esse tipo de chorumela, é porque em algum ponto você concordou comigo, e se você concordou comigo é porque a coisa tá preta pro seu lado também. O quão lascado a gente tá? Ah, eu não sei mesmo. Mas eu nem quero mais viver essa vidinha chata de ir pro trabalho, pra faculdade, pra casa, pro bar, e daí pra casa de novo, mas é exatamente o que eu acabo fazendo durante todo o ano. Acho que não há muita opção. Será que se eu meter uma mochila nas costas e sair por aí eu sobrevivo? Eu cresci em apartamentos, e o máximo de contato com a natureza que eu tive foi um acampamento meia boca com uma galera que eu conhecia, ao qual eu só fui porque estava muito apaixonado por uma menina, que por sua vez me deu um belo pé na bunda, o que me deixou deprimido, o que por sua vez me fez me trancar no apartamento e beber mais, o que por sua vez também me fez escrever mais, o que eu também achei uma grande bobagem de baixa qualidade literária. Agora entende o que eu quero dizer? Espero que sim, porque eu mesmo não entendo, e na verdade eu acho que nunca vou entender.

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