Quando ele sorri, todos nós sorrimos também. Não há como
não se sentir tocado por aquele sorriso cativante, aberto e receptivo emanado
do rosto de Louis Armstrong. Não há como não se apaixonar por sua marcante e
histórica introdução de “What A Wonderful World” (de novo ela), na fantástica versão
de 1970, facilmente encontrada na internet.
Louis Armstrong foi um poeta da música. O título,
frequentemente associado a grandes letristas, tais como Lennon, Dylan e Morrissey, pode ser aplicado a Armstrong no sentido
puramente musical. Poucos sintetizaram a emoção em ondas sonoras como Louis. O
momento que antecede a letra, o calor de sua voz emanando dos alto-falantes, e
o calmo e aconchegante final da canção traduz felicidade em música.
Ouvir Louis Armstrong é como ouvir Deus. Não sou
religioso, e nem sigo uma doutrina específica, mas, no íntimo de meu ser pouco
erudito e muito tocado, imagino que se as santidades falassem elas soariam
como Louis Armstrong. Não que Luis fosse um Deus. Ele era um humano, como eu e
como você, e é exatamente aí que está toda a magia.
Louis não tinha pressa. Louis não precisava se preocupar
com as contas do mês ou com qual sabor de pizza pediria na próxima vez. Ele
poderia (e devia) até se preocupar com isso, mas não quando cantava.
Definitivamente não. Louis era único em sua magnitude. Louis evocava as notas
com a calma de um beato que se prepara para a comunhão. Não sei se Louis era
católico, evangélico ou pagão. Não sei se teve amores, filhos ou se preferia
lasanha a spaghetti. Sei que ele podia cantar como poucos cantaram, e sei que ele
foi absoluto em sua vocação.
Louis – se me permite chama-lo de forma tão carinhosa e
íntima – seria um homem comum. Talvez até menos comum, considerando os tristes
e nada saudosos tempos de uma América racista e segregada. Mas Louis tinha o “feeling”.
Louis podia cantar como se o mundo estivesse prestes a acabar e ele não ligasse
nem um pouco para isso. Quando penso em Louis, imagino um sujeito tranquilo e
sábio, uma espécie de avô carinhoso que joga xadrez e ouve o noticiário no
rádio. Um cidadão de bem, que anda tranquilo na calçada, com seu paletó e seu
chapéu enfiado na cabeça, assobiando um jazz com a calma que só os grandes
homens têm.
Louis não precisaria ser um músico para ser um grande
homem. A áurea transmitida por ele já seria mais do que suficiente para cumprir
esta função.
Posso estar sendo muito intuitivo e sonhador ao proferir tais
afirmações (e provavelmente o seja), mas em relação a Louis, tenho uma certeza
quase absoluta de que estou no caminho certo. Quando Louis canta,eu, minha mãe,
minha avó e os defuntos do crematório da Vila Alpina sorriem com ele. Quando
Louis canta, até cachorros vira-lata uivam com mais prazer para a lua. Não um
uivo faminto e solitário, mas um uivo consolador e beatificado. Louis tem um
lugar reservado no céu, e acredito que ele tenha levado um pouco de cada um de
nós para lá. É onde estamos quando ouvimos suas belas músicas. E é onde
estaremos quando a última nota de “What A Wonderful World” soar.
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