sexta-feira, maio 25, 2012

O Maior Intérprete do Mundo ou Como Louis Armstrong Salvou Minha Vida

Louis Armstrong é único. Li dia desses que sua imortal versão de “What A Wonderful World” está entre as dez músicas mais tocadas em um famoso crematório da cidade de São Paulo. Só isso já mostraria como Louis Armstrong é importante nesta e na outra vida. Seu sorriso brilhante, seus ternos alinhados, seu fabuloso trompetista, e, é claro, sua voz grave, suave, reconfortante e apaixonante. Me perdoem pela repetição de adjetivos comuns, mas, ainda assim, nenhum deles faz jus ao sentimento causado por uma audição de Louis Armstrong.

Quando ele sorri, todos nós sorrimos também. Não há como não se sentir tocado por aquele sorriso cativante, aberto e receptivo emanado do rosto de Louis Armstrong. Não há como não se apaixonar por sua marcante e histórica introdução de “What A Wonderful World” (de novo ela), na fantástica versão de 1970, facilmente encontrada na internet.

Louis Armstrong foi um poeta da música. O título, frequentemente associado a grandes letristas, tais como Lennon, Dylan e Morrissey, pode ser aplicado a Armstrong no sentido puramente musical. Poucos sintetizaram a emoção em ondas sonoras como Louis. O momento que antecede a letra, o calor de sua voz emanando dos alto-falantes, e o calmo e aconchegante final da canção traduz felicidade em música.

Ouvir Louis Armstrong é como ouvir Deus. Não sou religioso, e nem sigo uma doutrina específica, mas, no íntimo de meu ser pouco erudito e muito tocado, imagino que se as santidades falassem elas soariam como Louis Armstrong. Não que Luis fosse um Deus. Ele era um humano, como eu e como você, e é exatamente aí que está toda a magia.

Louis não tinha pressa. Louis não precisava se preocupar com as contas do mês ou com qual sabor de pizza pediria na próxima vez. Ele poderia (e devia) até se preocupar com isso, mas não quando cantava. Definitivamente não. Louis era único em sua magnitude. Louis evocava as notas com a calma de um beato que se prepara para a comunhão. Não sei se Louis era católico, evangélico ou pagão. Não sei se teve amores, filhos ou se preferia lasanha a spaghetti. Sei que ele podia cantar como poucos cantaram, e sei que ele foi absoluto em sua vocação.

Louis – se me permite chama-lo de forma tão carinhosa e íntima – seria um homem comum. Talvez até menos comum, considerando os tristes e nada saudosos tempos de uma América racista e segregada. Mas Louis tinha o “feeling”. Louis podia cantar como se o mundo estivesse prestes a acabar e ele não ligasse nem um pouco para isso. Quando penso em Louis, imagino um sujeito tranquilo e sábio, uma espécie de avô carinhoso que joga xadrez e ouve o noticiário no rádio. Um cidadão de bem, que anda tranquilo na calçada, com seu paletó e seu chapéu enfiado na cabeça, assobiando um jazz com a calma que só os grandes homens têm.
Louis não precisaria ser um músico para ser um grande homem. A áurea transmitida por ele já seria mais do que suficiente para cumprir esta função. 

Posso estar sendo muito intuitivo e sonhador ao proferir tais afirmações (e provavelmente o seja), mas em relação a Louis, tenho uma certeza quase absoluta de que estou no caminho certo. Quando Louis canta,eu, minha mãe, minha avó e os defuntos do crematório da Vila Alpina sorriem com ele. Quando Louis canta, até cachorros vira-lata uivam com mais prazer para a lua. Não um uivo faminto e solitário, mas um uivo consolador e beatificado. Louis tem um lugar reservado no céu, e acredito que ele tenha levado um pouco de cada um de nós para lá. É onde estamos quando ouvimos suas belas músicas. E é onde estaremos quando a última nota de “What A Wonderful World” soar.

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