segunda-feira, outubro 15, 2012


Um dia você desiste. É mais fácil do que parece, mas você desiste. É uma bobagem falar em desistir antes dos 30 anos, eu sei disso, eu sempre soube disso, mas eu falava em desistir antes mesmo dos 20. Aí um dia eu desisti de verdade. Eu achei que esse dia nunca ia chegar. Eu me sentava em frente ao computador e teclava furiosamente. Eu tentava tirar alguma vida daquilo ali, mas a vida nunca vinha. Depois eu tentei tirar a morte, chamar a morte, amar a morte. Mas a morte também não veio. A gente é tão tolo que acha que pode controlar quando a morte vai vir. Mas não, a gente não pode não. É o seguinte, meu caro: a gente tá lascado, e temos que seguir em frente. É assim que funciona, não é mesmo? Veja só todos eles lá fora. Eles continuam seguindo em frente. Se começa a chover, eles sacam o guarda-chuva ou correm até uma marquise e ficam por ali, admirando a vida e esperando a água parar de cair. Eu costumava ser como um deles, talvez até melhor. Ou pior, eu acho que nunca vou saber. Eu só sei que eu corria até uma marquise e ficava cantarolando uma música do The Who e vendo todo mundo passar na minha frente. Mas eu cansei de ficar olhando pros outros na marquise, e vi todo mundo passar e ir embora. Eu continuei por ali, continuei cantando The Who, mas hoje, quando chove, eu só continuo andando. Acho que é o que eles chamam de crescer. Agora eu sinto os pingos caindo na minha cabeça, e eu já não me importo mais. Eu devia me importar, mas eu não me importo. Talvez eu nunca tenha me importado. Esse foi meu grande erro. Mas que diabos, não é mesmo? Eu cometi um milhão deles, e com certeza vou cometer outros milhões. É assim que é, e não adianta reclamar. As pessoas se arranjam. Elas arranjam namorados, casam, tem filhos, conseguem novos empregos. Nada disso devia importar muito, como não importa. Posso me contentar em descolar uma garrafa de vinho e ouvir um disco do Lovin’ Spoonful ou de qualquer outra banda. Na verdade, posso pensar em poucas coisas tão boas como essa. O vento fica soprando, como sempre soprou, e a minha janela já não parece tão desoladora. Agora a visão já me é familiar, e eu não estou mais assustado. Eu estou preparado pro que der e vier. Ainda não é hora de me mandar, ainda não é hora de desistir. Eu posso até ter desistido, mas eu tenho certeza que alguma coisa lá fora não desistiu de mim. E eu vou continuar esperando até ela vir. Eu realmente não me importo o quanto demore, contanto que eu possa ficar aqui dentro com minha garrafa de vinho. Espero que os pingos de chuva continuem caindo nos meus ombros e que as pessoas continuem embaixo das marquises. De alguma forma, isso me traz uma espécie de conforto, e isso é quase tudo o que eu sempre desejei.

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